domingo, 17 de abril de 2011

FUXICO NO ESTACIONAMENTO


          Nem te conto... Eu moro perto de uma escola e da sacada da minha casa eu vejo tudo o que acontece no estacionamento. É um entra e sai de gente dia após dia. Mas tem uma coisa que anda me deixando intrigada. Todo dia, no final da tarde, vejo duas mulheres que trabalham lá, até que simpáticas, indo para o estacionamento e lá ficam por um tempão batendo papo. Só podem estar fuxicando, você não acha? E o que é mais estranho: uma vai embora e a outra fica. Sabe, parece assim uma despedida. Mas elas se revezam. Um dia uma fica e a outra vai, e,  no outro dia é o contrário e assim de segunda à sexta-feira.

E, olha, tem dias que a conversa é rápida, mas tem dia... Quando elas dão pra rir ninguém segura, ficam lá dando gargalhadas. Estão rindo da cara de quem? Mas tem dias que uma delas sai triste, dá até dó de ver menina! E a outra vai lá, conforta, consola, dá abraço. No outro dia é a outra que parece que viu um fantasma toda assustada. A colega acalma e lá vai uma prá dentro da escola e a outra de carro prá casa. É sempre assim.

            Mas são topetudas as duas. Já vi cada situação e às vezes quando a coisa ferve, até escuto também! Outro dia, logo pela manhã, uma empacou com o carro no portão do estacionamento barrando a passagem. Gente, eu só vi o bafafá. Parece que não deixaram a moça entrar e ela disse que ia ficar ali mesmo. Só ouvi ela falar: Pode trazer os papéis  e mandar o pessoal que hoje eu vou trabalhar  aqui mesmo! Que doida ela! Pensei, professora é que ela não é. Imagine botar quarenta alunos naquele carro pequeno prá dar aula! Isso é “piti” de chefe, aposto!

E a outra noutro dia fez a mesma coisa; parou na entrada do estacionamento, apontava prá outro estacionamento particular que tem do lado de fora da escola, falando: “No Texas eu não ponho!” Tá certo, o lugar é assim meio abandonado, mas que história é essa de Texas?

Noutra vez,  a briga foi com o lixeiro. O coitado estava lá com o caminhão no meio do estacionamento recolhendo lixo, mas o lixeiro também era “da pá virada” e não moveu um centímetro o caminhão dele. As duas vieram. Uma delas queria sair. Foi outra encrenca! Mexeram com o estacionamento inteiro, só sei que vinha gente e saia gente. Um empurrava o carro de cá, outro de lá, a mulher esbravejava com o lixeiro e por fim depois de muita labuta, deixaram ela sair. Nesse dia pensei que fosse dar até polícia!

            Menina, elas arrumam confusão por tudo! Outro dia elas chegaram pro fuxico do final da tarde e uma delas ficou nervosa. Ela estava mostrando prá outra uns riscos que tinha no carro dela e a outra balançava com a cabeça lamentando. Só sei que a mulher saiu soltando fogo pelas ventas e enfiou a chave no carro e nada do carro abrir. De repente, começou a rir e eu só filmando... Você acredita?  Ela tava abrindo o carro errado!

            Tem dias que elas chegam no meio da tarde  carregadas de coisas e chamam mais umas amigas prá ajudar. Aí aparece outras moças com um carrinho... Guardam não sei o quê lá dentro e entram prá escola. Outras vezes uma delas chega, estaciona, pega o celular e lá fica. - Veja se pode um negócio desse, a mulher não tinha que entrar pra trabalhar? - Pois bem, aí aparece uma outra trazendo  uns papéis e a mulher se manda. Às vezes faz isso mais que uma vez por dia. Não é estranho esse movimento todo?

            E assim vai, dia após dia e o fuxico não acaba. Todo dia no final da tarde lá vão elas pro fuxico. Às vezes uma ou outra fica uma temporada sem aparecer. Quando isso acontece a que ficou é só tristeza... Anda pelo estacionamento se arrastando, sem ânimo... É a falta do fuxico! E aí quando a outra volta, minha filha, nesse dia pode contar no relógio, é mais de uma hora fofocando!

            Não sei não... Elas se parecem tanto. To prá dizer que são irmãs. Vai ver que trabalham juntas e no final do expediente ficam conversando sobre mainha, sobre uma tia que chegou do Norte ou um parente que casou... Sei lá! Mas hoje eu não resisti. Faz mais de cinco anos que vejo esse movimento dessas mulheres no estacionamento da escola. Hoje, com a maior cara de pau, desci e fui perguntar pras duas: Afinal vocês são irmãs? E o que tanto vocês fuxicam todo dia no final da tarde? Então elas me responderam:

Não, não somos irmãs de fato, apenas de alma. Eu sou a diretora e ela é a coordenadora da escola. Nós gostamos tanto do que fazemos que esse trabalho ocupa muito espaço em nossas vidas, em nossas cabeças e em nossos corações. Às vezes não cabe na  nossa  sala  e nem na nossa jornada de trabalho e ai sobra um pouquinho pro estacionamento! Mas também muitas outras coisas são importantes e ocupam um grande espaço em nossas vidas: fé em Deus,  família, casa, marido, namorado,  receita de bolo, crochê, tricô, fuxico! Então, no final da tarde a gente deixa no estacionamento essa paixão pelo trabalho  e vai prá casa. No dia seguinte a gente pega de volta. É por isso que ficamos muito  bravas quando não nos deixam sair ou entrar!”

 Menina, que gente doida! No final até me convidaram prá conhecer a escola. Eu hein... Se só aquelas duas já fazem tanto fuxico, imaginem o tanto de fuxico que não deve ter numa  escola deste tamanho! 
                                                              
                                                                                                        Rosmari Pereira de Oliveira

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